sexta-feira, 13 de julho de 2012

A Mídia e a Mediocridade

Por Ripp Cozzella - Chef e proprietário do Qorthon Restaurante



Nos tempos antigos se pegava uma espada e ia-se à guerra e lá mostrava-se de verdade o valor de um guerreiro. Era simples: se voltasse vivo, era bom, caso contrário só alguns familiares chorariam.
De repente Cesar teve uma brilhante ideia: contratar um poeta para escrever suas campanhas de guerra, mas eram todos relatos baseados em suas próprias escritas. O futuro imperador sabia que a propaganda era a alma do negócio.
E o tempo passou, as guerras hoje são feitas com armas tecnológicas, não existem impérios dominando metade do mundo, mas existe uma certa coisa que ainda é eficaz: a propaganda.
Se pega algo ou alguém e do dia para noite transforma-o em estrela, em herói, em alguém cujo valor poucas vezes foi colocado à uma prova de verdade.

O caso de um Jamie Oliver, um cozinheiro pobre em técnicas e um grande misturador de ingredientes, mas popular, vemos a comprovação do que eu falo… Seus shows deixam saudades dos shows dos Menudos no domingo do Gugu (argh, nunca vi, mas deixo um exemplo para chocar).
São absolutamente ridículos, mas paga-se 150 dólares com seis meses de antecedência para poder ver o loirinho fazer carne assada com spaghetti ao som de Techno-music e iluminação de fazer Iron Maiden achar que se apresenta com uma lanterna de pilha. Sei que existem defensores dele e que ele tem algum valor ou forjou esse valor através de uma esperta campanha em prol das criancinhas. Aliás, elas, as crianças, são excelentes artifícios para se chegar ao coração da população.
Ler que uma afamada doceira, que agora é casada com um expoente da culinária catalã, vem ao Brasil e vai, por muita insistência e um caminhão de dinheiro, servir um bolo aos Mauricinhos e Patricinhas que se dispõe a gastar tufos de dinheiro apenas para correrem o risco de aparecer em uma foto ou uma coluna social… O show vai ter iluminação, fogos de artifício, dançarinas e tudo mais. O bolo deve-se chamar Britney Spears ou Madona, no mínimo.
Canais de televisão entram na onda atrás de dinheiro fácil e premiam a mediocridade. Tem canais bem medíocres. Ontem eu gargalhei vendo a gravação de uma pseudo-cozinheira tentando retirar um medalhão de mignon de uma grelha antes dele ficar pronto e despedaçou o pedaço de carne que a pobre vaca deixou antes de ser sacrificada. Será que o diretor não podia cortar a cena? Será que ele acha que só domésticas sem conhecimento assistem o programa? Nunca aprendeu que só quando sela a superfície da carne é que ela solta com facilidade da chapa?
Receitas incompletas, técnicas escondidas, finalizações mágicas (sim, o comercial chega e, de repente, quando voltam aquilo está impecável, cheio de adereços enfeitando o prato e ninguém fica sabendo como o milagre ocorreu), papo furado, piadinhas sem graças, tudo faz parte do circo gastronômico moderno. O que salva são alguns expoentes de competência que ainda conseguem ficar por lá. Devem morrer de vergonha.
Cozinheiros de alto gabarito são obrigados a cozinhar nas ruas para poder levar a um público maior seus feitos, enquanto chefs-modelo de revista estão dando entrevistas como se fossem os descobridores da cura do câncer. Que sorriso lindo tem aquele, diria a cabeça-oca que acha que isso só ocorre nesse segmento. Somos controlados, robôs que se programam divertindo-se na frente das televisões e das revistas. Fazem o que “eles” acham que “você” deve fazer. Seria uma “propaganda política gastronômica” se houvesse o termo.
Sorte dos escolhidos, que mesmo destilando pobreza e mediocridade são alçados aos panteões da fama e do dinheiro. Daí podem até investir, abrir seus luxuosos estabelecimentos e contratar cozinheiros de verdade para cozinhar aos seus clientes. O problema é que a fama aumenta mais ainda com os enganados que acham que foi o astro quem ficou horas de pé cozinhando.
E na pior das situações, um bando de descabeçados acha que cursando uma faculdade vão chegar lá.
Certa época a mídia fez muita gente jovem procurar a odontologia, a medicina e a Propaganda & Marketing. Hoje os publicitários fazem campanha para médicos e dentistas incompetentes e falo com conhecimento de causa, pois já estive nesse meio.
Amanhã teremos que explicar aos nossos filhos porque existem tantos gastrônomos desempregados, tantos cozinheiros bons ganhando quase salário mínimo, tanta insuficiência de saber e, em casa, continuam os que aprenderam pela televisão a não saber fritar um simples bife.
Viva a mídia e os panacas que seguem à risca o que ela apregoa.

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